Evitar a dupla tributação dividendos

Evitar a dupla tributação na prática

Recebe dividendos de empresas estrangeiras, e está frustrado com a dupla tributação a que é sujeito? Se sim, este artigo é para si.


Como expliquei anteriormente neste artigo, a dupla tributação ocorre quando os mesmos rendimentos são taxados duas vezes, uma, no País de origem, e outra no País de residência do contribuinte fiscal.

O presente artigo tem como objetivo complementar o artigo anterior, e explicar o que deve ter em conta para maximizar o rendimento líquido dos seus investimentos.

Convenções sobre a dupla tributação

Antes de avançarmos, é necessário entender que as convenções para evitar a dupla tributação são acordos existentes entre os diferentes Países, e em que estes se comprometem a:

  • No País de origem do rendimento: não taxar um residente fiscal do outro País a uma taxa superior à acordada na convenção celebrada entre ambos os Países;
  • No País de residência do investidor (Portugal): Utilizar o montante pago na origem como crédito de imposto, fazendo com que o investidor não seja duplamente tributado;

Por exemplo, à data de hoje, a convenção celebrada entre Portugal e Alemanha estipula que a taxa sobre dividendos não pode ser superior a 15%. Isto significa que como residente fiscal em Portugal, e partindo do pressuposto que declara corretamente os seus dividendos no anexo J, só terá de pagar a diferença entre os 28% e os 15% (se optar pelo não englobamento)

Poderá consultar aqui o quadro resumo das convenções celebradas por Portugal com outros países para evitar a dupla tributação. Algumas das taxas acordadas são:

  • Bélgica 15%
  • Canadá 10%
  • China 10%
  • França 15%
  • Estados Unidos da América 15%
  • Países Baixos 10%

Dupla tributação na prática

Vimos até agora que há acordos celebrados entre os vários países para que não paguemos mais em impostos do que pagaríamos se estivéssemos a investir em Portugal. Mas, o que acontece quando pagamos uma taxa superior à que se encontra na convenção de dupla tributação?

Se a taxa de imposto retido na fonte for superior à estabelecida na convenção entre Portugal e esse País, o que pagou a mais não servirá como crédito de imposto.

Consideremos o caso de dividendos recebidos de uma empresa americana, e que por não ter preenchido o formulário W-8BEN, ser-lhe-á cobrado 30% em vez dos 15% definidos na convenção entre Portugal e os EUA.

Assumindo que o dividendo bruto é 100 €, 30 € serão retidos na fonte. A partir daqui, as coisas tendem a piorar dependendo se usa ou não uma corretora nacional.

No caso de usar uma corretora nacional, serão ainda cobrados automaticamente, 28% de imposto, o que significa que dos 100 € brutos, só caíram na sua conta 42 €. 58% do seu dividendo eclipsou-se, sem sequer ter tocado na sua conta.

Uma vez que já pagou imposto em Portugal, não é obrigatório declarar esse rendimento, ficando, contudo com uma taxa de imposto altíssima. Por esse motivo, é aconselhável preencher o anexo J corretamente para obter parte do imposto pago como crédito de imposto, sendo essa parte, a diferença entre os 30% que pagou na fonte e os 15% que existem no acordo de dupla tributação entre os EUA e Portugal.

Obtendo o crédito de imposto de 15%, a taxa total de imposto pago considerado é definida pelos 30% + a diferença entre 28% e os 15% do acordo. Desta forma, em vez de pagar 52%, pagaria apenas 43%.

Neste caso concreto, poderia minimizar a taxa de imposto pago de 2 formas:

  1. Preenchendo corretamente o formulário W-8BEN que a sua corretora disponibiliza, de forma que lhe sejam retidos apenas os 15% sobre os dividendos;
  2. Contactando a autoridade tributária do outro País (EUA) para o reembolsarem sobre os 15% pagos em excesso, uma vez que é residente fiscal em Portugal. (para valores reduzidos, creio que seja demasiado trabalho para compensar)

Dividendos DEGIRO de empresas portuguesas

Spoiler alert: prepare-se para receber muito menos do que gostaria, principalmente se não estiver atento.

A DEGIRO retém atualmente 35% de imposto sobre dividendos de empresas portuguesas, mas há quem defenda que o imposto é retido em Portugal, e como tal, que a sua declaração não deveria ser obrigatória.

A AT discorda e diz que devem ser declarados no anexo J utilizando como País da fonte os Países Baixos. Eu estou no processo de tentar provar que os impostos são retidos em Portugal, e que por isso, não será necessário declarar. Até lá, e seguindo as recomendações da AT, vejamos quanto pagamos em impostos.

Para simplificar, vamos considerar que recebeu 100 € em dividendos da EDP através da DEGIRO, e que segue as recomendações da AT, registando como país da origem dos rendimentos os Países Baixos.

Dos 100 EUR, caem na sua conta 65 devido aos tais 35% referidos anteriormente.

A convenção de dupla tributação entre Portugal e os Países Baixos refere que a taxa é de 10% para dividendos. Se se recorda, tal significa que no máximo, será aplicado, como crédito de imposto, esses mesmos 10%. Assim, quando preencher o anexo J com o montante ilíquido e o valor retido de 35%, só 10 € é que serão tidos em consideração.

O cálculo da AT processa-se da seguinte forma:

  • Imposto que deve ser pago em Portugal: 100 € * 28% = 28 €
  • Imposto pago nos Países Baixos, tendo como máximo os 10%: 100*10% = 10 €

Deste modo, o valor remanescente de imposto a pagar é de 18 € (28% – 10%), ou seja +18% do que o que já tinha sido retido, fazendo com que o valor total de imposto pago seja de 53%. Isto é demasiado, não é?

Como pode recuperar o imposto pago em excesso neste caso?

Os 7% que a DEGIRO cobrou a mais, proveniente da diferença entre 35% e os 28%, poderá recuperá-los facilmente contactando a DEGIRO, desde que apresente prova de ser residente em Portugal. Escrevi previamente um artigo com tudo o que necessita de saber para recuperar esse montante. Saiba mais clicando neste link.

O mais difícil, porém, é a recuperação dos 18% que pagámos a mais, além dos 28% a que legalmente estamos sujeitos em Portugal.

Assumindo que a AT está correta e que o imposto é efetivamente retido nos Países Baixos, então tal significa que os Países Baixos cobraram uma taxa superior ao que está no acordo de dupla tributação com Portugal. Neste caso, o reembolso deve ser pedido à autoridade tributária dos Países Baixos.

Se a AT estiver errada, e o imposto seja efetivamente retido em Portugal, então ao não declarar, não estaria sujeito aos 18% adicionais. Como disse acima, e à data de hoje, não tenho prova que a AT esteja errada, mas claramente uma das entidades está a prestar informações incorretas (DEGIRO ou AT).

Acreditando na DEGIRO, não necessita de declarar, mas terá o risco de ser contactado pela AT por dividendos não declarados. Utilize o seu melhor discernimento para enveredar por um ou outro caminho.

Conclusão

Os acordos celebrados entre Portugal, e outros países, permitem evitar a dupla tributação de dividendos. No entanto, é necessário ter alguns aspetos em consideração, e declarar convenientemente os rendimentos. Se nada fizer, o processo não é automático.

A primeira coisa que deve fazer é a de consultar a taxa acordada entre Portugal e o país de origem dos dividendos. Com base na taxa, poderá saber se está a ser taxado a uma taxa superior e tentar descobrir como pode baixar a mesma, por exemplo, no caso dos EUA pode preencher o formulário W-8BEN. Consulte aqui as taxas atuais dos acordos de dupla tributação.

O segundo ponto é a correta declaração desses dividendos no anexo J. Poderá obter mais detalhes no artigo como evitar a dupla tributação

Espero que este artigo o ajude a poupar algumas centenas de euros, entendendo mais detalhadamente o processo do crédito de imposto e como evitar pagar impostos a que não está legalmente obrigado.

Bons investimentos.

Nota: Os exemplos acima assumem sempre que está a optar pelo Não englobamento de dividendos, daí a utilização da taxa de 28%.

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Jorge Nuno Prieto de Ferreira
3 anos atrás

Você está a cair num erro. A De giro não cobra impostos em Portugal dai se aplicar a regra dos 35% definida pela CMVM . Desde á 10 meses a De giro já era , foi comprada pelo Flatex Bank AG dai para fazer compras na plataforma da DE giro você ter que abrir obrigatoriamente uma conta naquele banco ,para a qual faz as transferencias bancárias do banco portugûes.
jorge ferreira

Jorge Nuno Prieto de Ferreira
3 anos atrás

Esclarecimentos adicionais : A) até meados do ano passado v. podia pedir á de giro por mail o reembolso da diferença entre os 35 e os 28% ao fim de 6 a 8 meses acabaria por receber o crédito , acompanhado da conversa de que era um especial favor que a de giro lhe prestava. Acresce que nessa altura v. fazia uma transferencia para a conta da de giro no Deuscth Bank que ainda tinha agencias em portugal , coisa que acabou. B) A degiro tinha, nessa altura , um numero de contribuinte portugues , necessario para ter a conta… Read more »

Jorge Nuno Prieto de Ferreira
3 anos atrás
Reply to  Sergio Maria

1- Os 35% , não caiem do céu. È uma directiva da CMVM para vendas a particulares no estrangeiro . No site há um telefóne gratuito que pode consultar. 2- Se a informação da de giro é que paga impostos em portugal ,por retençao na fonte, então eles que lhe fornecam o numero de contribuinte português e faz a declaração no anexo E . a ATA far-lhe-á o reembolso do imposto pago a mais. a ATA tem o E- balcão com telefone gratuito . A melhor hora para contacto e´entre as 9 e as 9,30H 3 Quanto ao Flatex de… Read more »

Hugo Paiva
3 anos atrás
Reply to  Sergio Maria

Boa tarde, Sergio Em relação a declarar ou não os dividendos de empresas portuguesas que se recebe pela Degiro, encontrei isto da DECO: “25. INVESTIMENTOS COM CORRETORAS OU OUTROS INTERMEDIÁRIOS ESTRANGEIROS. A tributação de rendimentos obtidos através de corretoras sediadas no estrangeiro terá de obedecer às regras previstas no ordenamento jurídico de cada país. Assim, se tiver recebido, por exemplo, dividendos de ações detidas através de corretoras estrangeiras, terá de os declarar no IRS se forem relativos a ações nacionais e não tiver havido retenção na fonte (para Portugal). Deve utilizar o quadro 4-A do anexo E. Se houve retenção… Read more »

Daniela Soares
3 anos atrás
Reply to  Sergio Maria

Neste caso: 1. Como é que fariam este ano se tiverem dividendos de empresas portuguesas através da Degiro, Onde é que declaravam (em caso de não englobamento)?
2. Ao englobarmos as mais/menos valias (neste caso de empresas nacionais e com broker nacional) como se procede com os dividendos quer os portugueses quer estrangeiros?

Obrigada

David Rodrigues
2 anos atrás

Olá, já li e reli os vários artigos sobre tributação de dividendos, mas as minhas dúvidas permanecem. 1 – Recebendo dividendos de empresas cotadas em bolsa no estrangeiro, temos que pagar imposto nesse país e em Portugal? Ou seja, a convenção apenas diminui a taxa a pagar no país de origem, mas temos sempre que pagar X% + 28% ? 2 – Todo o esforço é “apenas” para que seja reduzida a taxa cobrada no país de origem? 3 – Porque é que somos tributados 2 vezes? Uma convenção de dupla tributação não deveria servir para se pagar imposto apenas… Read more »

David Rodrigues
2 anos atrás
Reply to  Sergio Maria

Muito obrigado pelo feedback.

Como só agora estou a começar e estou a utilizar a DeGiro, fiquei só com uma dúvida. Já recebi dividendos por exemplo dos EUA e ao abrigo da convenção foram retidos 15%. Quando fizer o IRS, no anexo J, declararei esse montante. Se optar pela tributação autónoma, este valor que paguei não é abatido aos 28%?

lucio moniz
5 meses atrás

A degiro não me interessa. O que é realmente importante é preencher o requisito da AT de obter junto da autoridade fiscal do país estrangeiro um certificado comprovativo dos impostos pagos lá sobre dividendos, no caso de quem quer englobar. E contactar essas entidades? E quais os procedimentos? Aí é que está a dor. Mas o artigo não é mau, obrigado.

lucio moniz
5 meses atrás
Reply to  Sergio Maria

Obrigado pelo artigo, no entanto a minha situação é de quem está no 1° escalão, declarar 50% não me é tão útil qto o crédito, pela nossa AT, do imposto pago no estrangeiro. Assim pagaria apenas 14,8% no total, o que para quem ganha tão pouco até é imposto a mais… Em alguns casos já beneficio da taxa reduzida de 15% lá fora, qdo o banco trata disso. Noutros casos ainda não sei o que fazer, há países mais complicados. O que é difícil é saber como obter da AT estrangeira o certificado (e qual) para responder à exigência da… Read more »

Tiago
2 meses atrás

Olá Sérgio e olá a todos! Relativamente à declaração dos dividendos pela deGiro posso confirmar que a AT obriga a isso no anexo J, mas depois seremos duplamente tributados porque a AT Holandesa não declara a retenção na fonte dos 35%. Aconteceu-me para o ano de 2021 onde tive de apresentar uma declaração de substituição e depois cobraram-me +18% acrescidos à retenção dos 35% (como explicado pelo Sérgio). Relativamente a isso como lidou com a AT (nem descrevo o tempo, mensagens e atendimento prestado por quem cobra mas não tem formação suficiente para temas mais complexos come este) e chegou… Read more »

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Olá, chamo-me Sérgio e sou um apaixonado por investimentos e finanças pessoais. Espero partilhar algumas dicas e conhecimento para que possa alcançar mais rapidamente a sua independência financeira. Fique ligado e compartilhe também as suas ideias.

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